Desligar para voltar a sentir

Durante a maior parte da minha vida, as redes sociais foram quase como uma extensão de mim. Cresci a partilhar tudo, os meus outfits preferidos, os pequenos-almoços bonitos, os vídeos a dançar, os momentos "espontâneos" cuidadosamente planeados. Fui sempre aquela rapariga "popular", com milhares de seguidores, mensagens constantes, e milhares de likes em qualquer foto que publicava.
Mas ultimamente... tenho-me sentido vazia. Desde que a minha relação terminou, uma relação que, agora percebo, nunca foi realmente saudável, sinto-me completamente desconectada. Era como se tivesse estado a viver uma versão inventada da minha própria vida. Online éramos o casal perfeito, mas na realidade não era bem assim, era um jogo de aparências, um esforço constante em passar uma coisa que não eramos. E quando acabou, doeu principalmente pelo que eu tinha que admitir a mim mesma: que me perdi algures pelo caminho.
Nos últimos dias, dei por mim a chorar sem saber porquê, a ficar horas a fazer scroll, a comparar-me com vidas que sei, no fundo, que também não são reais. E foi aí que decidi: precisava de fazer um detox, não só das redes, mas de tudo o que me afastava de mim.
Hoje foi o primeiro dia. Acordei com aquele impulso automático de agarrar no telemóvel. Queria ver notificações, stories, qualquer coisa que me distraísse do silêncio, mas não o fiz, forcei-me a parar. Respirei fundo, levantei-me e fui até ao guarda-fatos. Lá no fundo, vi a minha tote bag preferida, aquela que usava quando saía sozinha, antes de me moldar para agradar aos outros. Peguei nela, coloquei lá um livro que andava a adiar ler há meses, um caderno e uma caneta, os meus fones, toalha, protetor solar e alguma comida e fui até à praia.
Ao chegar, senti-me meio deslocada. Estar sozinha em público parecia... estranho. O instinto de ir ao telemóvel era quase incontrolável, mas resisti. Escolhi um canto mais calmo da areia, estendi a toalha e deitei-me. Fechei os olhos. O sol aquecia-me a pele e o som das ondas fazia-me lembrar a infância. Pouco a pouco, a ansiedade foi diminuindo, o silêncio deixou de ser pesado e começou a ser conforto.
Abri o livro e perdi-me nele. Era como se o mundo à minha volta tivesse desaparecido. Já não me importava com o facto de estar sozinha. Estava ali. Presente. Mais tarde, fui até à água. O primeiro mergulho foi gelado, mas revigorante. As ondas embalavam-me e eu sentia-me viva, como há muito não sentia. Boiei durante uns minutos, a olhar o céu, a sentir o corpo leve. Livre.
Quando voltei para a toalha, uma criança aproximou-se com um balde cheio de conchas.
— Olá! Queres ver as minhas conchas?
— Claro que sim! Que lindas! Onde é que as apanhaste?
— Ali, perto das pedras! Há uma que brilha quando está molhada! Queres ver?
— Quero muito. Sabes, acho que também vou procurar uma para mim. Queres ajudar-me?
— Sim! Vamos fazer uma coleção!
E assim, ganhei um pequeno amigo por uns minutos. Rimos, conversámos, e ele foi embora com a promessa de mostrar a coleção à mãe.
Deitei-me de novo, pus os fones e deixei a música fazer o resto. O sol ia secando o meu corpo e, pela primeira vez em muito tempo, senti-me inteira. Senti cada emoção sem medo. Estava vulnerável, sim, mas em paz.
Ao ver o pôr-do-sol, emocionei-me. Não foi só pela beleza do céu pintado de laranja e rosa, mas sim porque percebi algo que há muito ignorava: viver conectada constantemente com o mundo digital tinha-me desligado do mais importante, de mim, das minhas emoções, do agora.
As redes ensinaram-me a parecer bem, mas não a estar bem. Ensinaram-me a filtrar tudo, menos o que sentia por dentro. E ali, com os pés enterrados na areia e o coração mais leve, percebi a diferença entre viver e publicar uma vida. Pela primeira vez em muito tempo, senti a vida a acontecer espontaneamente. Com as suas ondas, os seus silêncios, as suas dores e os seus pequenos milagres, como o riso de uma criança ou o calor do sol na pele.
Desligar-me foi, afinal, a única forma de voltar a ligar-me. A mim. À vida. Ao que é real.
Peguei na minha tote bag, arrumei as minhas coisas, e despedi-me de um dia incrível, conectada comigo própria.
A Importância do Detox Digital
Vivemos numa era em que estar online é quase sinónimo de estar vivo. Entre notificações, e-mails, stories e mensagens, os nossos dias são constantemente preenchidos por estímulos digitais, estamos sempre ligados, sempre disponíveis. Sem darmos conta, vamos perdendo a ligação mais importante de todas: a que temos connosco próprios.
É aí que entra o detox digital, não como uma moda ou uma tendência, mas como uma necessidade urgente de nos reencontrarmos no meio do ruído.
Fazer um detox digital não significa renegar a tecnologia ou eliminar para sempre o mundo digital da nossa vida. Significa, sim, desligar o piloto que nos mantém reféns de notificações, e criar espaço para o silêncio, para a presença, para a realidade não filtrada.
Quando nos afastamos temporariamente das redes sociais e dos ecrãs, começamos a perceber coisas que antes passavam despercebidas: o peso real do cansaço que sentimos, a ansiedade que se esconde nas comparações constantes, a dificuldade em estar verdadeiramente sós, sem likes, sem confirmações externas, sem distrações. E é nesse espaço, inicialmente desconfortável, que começamos a ouvir-nos de verdade.
Um detox digital permite-nos reconetar com o que é essencial: tempo de qualidade connosco, conversas sem interrupções, momentos que não precisam de ser partilhados para serem válidos. Permite-nos reaprender a estar presentes, com os outros, mas sobretudo connosco.
Além disso, é um ato de autocuidado. Reduz o stress, melhora a qualidade do sono, aumenta a produtividade e estimula a criatividade. Mais do que isso, devolve-nos o controlo, pois deixamos de reagir ao mundo virtual e começamos, finalmente, a agir na nossa própria realidade.
No fundo, um detox digital é um lembrete silencioso de que a vida mais bonita não é necessariamente aquela que se publica, mas sim a que se vive.
Desligar não é fugir, é escolher e, às vezes, a escolha mais importante que podemos fazer é mesmo essa: sair do online para regressar a nós.

