Naquela tarde de sol, algures o inverno, todas receberam a inesperada mensagem da Alice: um convite para um almoço no próximo fim de semana. “Tenho algo importante para vos contar”, dizia ela, sem rodeios, mas com uma doçura que fez bater mais rápido o coração das outras três amigas.
Mariana, Beatriz e Carolina rapidamente adiaram compromissos e reorganizaram as suas agendas para conseguirem estar presentes. Afinal, eram anos sem se verem, e a vontade de estarem novamente lado a lado era muito apetecível.
No dia do almoço, encontraram-se num restaurante que Alice escolhera cuidadosamente, um sítio acolhedor, com mesas de madeira escura e janelas grandes, onde o cheiro do café se misturava com o de pratos deliciosos que lá eram servidos. À medida que se aproximavam uma a uma da mesa, os sorrisos foram-se alargando e as vozes, já cheias de emoção, começaram a subir de tom, tal era a excitação de se verem novamente. Abraçaram-se com força, sem pressa de largar.
Enquanto aguardavam os pratos, perderam-se em memórias dos tempos da faculdade. Riram-se das noites passadas a juntar moedas para partilharem uma garrafa de vinho barato, das tardes de sábado em que afogavam as saudades de casa com bolos e chá num café perto da faculdade, e das muitas madrugadas em que estudavam freneticamente, sem dormir, rezando para conseguirem uma nota decente na frequência. Essas lembranças aqueciam o coração e, por momentos, fazia-lhes parecer que todos aqueles anos não tinham passado.
À sua vez, cada uma começou a atualizar as amigas sobre a própria vida. Mariana, agora com um brilho novo no olhar, contava que se tinha divorciado há dois anos e que, desde então, redescobrira uma liberdade e uma paixão pelas artes que há muito não sentia. Inscrevera-se em aulas de teatro e pintura, e recentemente estava a viver um novo amor, desta vez, mais leve e com mais paz.
Beatriz partilhou que, após anos intensos a trabalhar como investigadora numa universidade em Lisboa, um “burnout” a fizera repensar acerca do rumo da sua vida. Decidira deixar o ambiente universitário e fora viver com o companheiro e a filha pequena para o Alentejo. Lá, encontrara uma nova forma de estar, ensinando yoga numa comunidade rural, rodeada de campo e tranquilidade. “É uma paz diferente, sabem? Mas uma paz que precisava para mim e para a minha família”, confessou.
Carolina, com um sorriso doce, contou que vivia com o mesmo namorado dos tempos de faculdade. A impossibilidade de terem filhos fora um momento delicado, mas juntos decidiram que haveria muitas formas de viver a vida em plenitude. Compraram uma caravana e adotaram um cão a quem chamaram Pelintra. “Ele é o nosso menino”, disse, mostrando uma foto do animal. O plano era simples e cheio de aventura: iriam explorar o mundo os três, um destino de cada vez, sem pressa e sem rotinas.
E então, chegou a vez de Alice, a grande responsável pelo reencontro. Todas a observaram em silêncio, pressentindo o nervosismo no seu olhar, uma fragilidade que Alice nunca antes tinha deixado transparecer. Depois de um momento de hesitação, ela sorriu, apesar da expressão séria, e começou a falar, com a voz a tremelicar levemente: “Amigas, a notícia que tenho para vos contar não é das melhores…” Fez uma pausa, enquanto as outras prendiam a respiração. “Há umas semanas descobri que estou doente. Embora os médicos estejam otimistas com o tratamento, e eu também, esta notícia fez-me perceber como a vida é fugaz e como tenho vontade de a viver.”
As três amigas entreolharam-se, com expressões sérias e olhos brilhantes de emoção. Alice sorriu, tentando suavizar o momento e, com uma energia nova na voz, continuou: “Lembram-se de, há uns anos, termos falado de fazer uma viagem juntas? Sempre adiámos, cada uma seguiu o seu rumo, perseguiu os seus sonhos, enfrentou os seus desafios… Mas agora sinto que chegou o momento. Quero muito fazer essa viagem antes de começar os tratamentos.”
Sem hesitar, as amigas estenderam-lhe as mãos, enchendo-a de abraços e palavras de apoio, sentindo o peso daquela revelação e o amor que as unia, ainda intacto, após todos aqueles anos. Alice então pegou numa caixa metálica cheia de lápis, que trazia desde os tempos de faculdade, e num bloco de notas, e com um sorriso, disse: “Quero que cada uma escreva uma data e o destino que gostaria de visitar.”- disse, enquanto distribuía uma folha e um lápis a cada uma.
Enquanto escreviam, entre sorrisos e reflexões, foi-se formando um consenso. A semana entre o Natal e o Ano Novo, quando todas poderiam escapar das responsabilidades e estar juntas, foi a escolhida. E o destino? Paris, a cidade com que tantas vezes sonharam. O simples ato de escrever aquelas palavras encheu o ar de uma esperança renovada e de um entusiasmo quase juvenil.
Alice guardou as folhas com o mesmo carinho com que guardava as memórias daquela amizade. Olhou para cada uma e disse: “Esta viagem é muito mais do que uma aventura. É uma forma de nos encontrarmos com aquilo que fomos, e que de alguma forma, apesar de tudo, nunca deixámos de ser. Vamos voltar a ser as quatro, sem preocupações, nem passado, nem futuro – só nós, como dantes. Sei que esta viagem vai dar-me a força que preciso para encarar o que está para vir. E daqui a dez anos, marcaremos outro reencontro, para fazermos, mais uma vez, o ponto de situação das nossas vidas”.
Com lágrimas nos olhos e sorrisos nos lábios, as amigas brindaram à vida, à amizade, e à certeza de que, apesar do tempo e da distância, os laços verdadeiros perduram. E ali, naquele instante, fizeram uma promessa silenciosa, mas profunda, de que, acontecesse o que acontecesse, continuariam a ser sempre o apoio, a luz e a inspiração umas das outras.
Esta história traz-nos uma reflexão profunda sobre a importância da permanência das verdadeiras amizades nas nossas vidas. É um lembrete de que, mesmo quando os caminhos da vida nos separam, os laços que criamos com aqueles que nos conhecem de forma autêntica resistem ao tempo, à distância e às transformações pessoais. Muitas vezes, é fácil perder o contacto com amigos antigos quando cada um segue a sua vida, as obrigações aumentam, os sonhos mudam, e as prioridades começam a ser outras. Contudo, a amizade genuína, que atravessa fases desafiantes e momentos de partilha intensa, deixa raízes tão profundas que, em qualquer reencontro, tudo o que há de essencial sobrevive intacto.
A história também retrata a instabilidade e fragilidade da vida e como, diante de situações difíceis, somos chamados a dar prioridade ao que realmente importa. Ao reunir as amigas para partilhar a sua situação atual, Alice não apenas buscava apoio, mas também procurava recuperar a alegria e a coragem que viveram juntas, de maneira pura e despreocupada, nos tempos de faculdade. Essa decisão de fazerem a viagem simboliza uma necessidade humana universal de recordar quem fomos em momentos cruciais, para que possamos seguir em frente com mais força.
A vontade de Alice de viver plenamente, mesmo diante da incerteza, é uma inspiração para que não adiemos as oportunidades de estarmos com aqueles que amamos e de realizarmos sonhos. Ela recorda-nos que devemos ser proativos em celebrar as pessoas que nos são importantes e a valorizar o “aqui e agora,” sem esperar pelo “amanhã” ou por um momento mais conveniente. Cada encontro, cada abraço, cada viagem é um investimento naquilo que temos de mais precioso: o amor e a cumplicidade com aqueles que escolhemos como família.
Em suma, esta história é um tributo à amizade, à resiliência e ao valor de viver o presente. Ela convida-nos a cuidar das nossas relações e a dar prioridade às experiências e ligações que nos nutrem, pois, no final, são esses momentos que nos dão a coragem para enfrentar as adversidades da vida.
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