São 07h30 e como sempre já ando a correr de um lado para o outro. Todos os dias prometo a mim mesma que me vou levantar mais cedo, fazer as coisas com calma e ter uma manhã relaxada, mas depois a realidade é outra. Acabo sempre por fazer repetidos snoozes ao despertador e depois pareço uma barata tonta, a tentar fazer tudo em tempo record.
Hoje não é o dia certo para me atrasar, tenho de fazer uma entrevista na casa de uma cantora famosa e ainda demoro algum tempo a chegar lá. Só de pensar já fico nervosa!
Dirigindo-me para casa dessa cantora, questionava-me coisas como: Será que ela é igual às redes sociais? Que hábitos terá? Será que vai ser simpática? Será uma diva?
Uma das coisas que mais gosto no meu trabalho como jornalista é o fator surpresa, nunca sabemos o que está por trás daquilo que se aparenta ser, o que nos pode surpreender pela positiva ou pela negativa. Sinto que tenho sempre a oportunidade de alargar os meus horizontes com as ideias que vou recolhendo de cada pessoa que entrevisto, o que é muito gratificante.
Ao longe já era possível ver grandes portões, que ficavam ainda maiores à medida que o meu carro se aproximava da casa dela. Neste momento o coração começou a bater mais forte, talvez por também eu ser fã dela, mas segui com serenidade em direção aos mesmos. Fui recebida por um senhor que me indicou onde deveria estacionar o carro, bem como o lugar onde deveria aguardar pela chegada dela.
Olho à volta e a casa é mesmo aquele estereótipo que imaginamos quando pensamos na casa de uma pessoa famosa, com grandes jardins que desaguam numa fantástica piscina, seguindo-se um hall com várias mesas e cadeiras, onde provavelmente toma o pequeno-almoço quando está bom tempo. Como estava um lindo dia de sol, foi aí que me indicaram para aguardar a sua chegada. Uns minutos depois surge ela, com um vestido simples branco, chinelo de dedo no pé, cabelo amarrado e uma travessa com uma cafeteira e duas canecas. Nunca haveria imaginado que me recebesse assim. De certa forma achei que a iria vê-la com aquele glamour que aparece nas revistas, mas, mais uma vez, os meus preconceitos foram postos à prova. Afinal ela era uma pessoa exatamente igual às outras e isso deixou-me mais à vontade.
Aproximou-se, cumprimentando-me com dois beijinhos e dizendo o seu nome, como se eu não a conhecesse. Pousa a travessa na mesa de apoio ao nosso lado, senta-se e faz-me sinal para me sentar também, ao qual obedeço.
- “Queres café?” - Pergunta já com a cafeteira pronta a verter o café para uma das canecas que trazia. Eu respondo que sim e de repente era possível sentir o agradável cheiro a café a pairar pelo ar.
- “Sempre que tenho oportunidade, gosto de tomar o meu café aqui, neste lugar, com esta caneca. É um ritual que me faz bem” – Afirma, enquanto se prepara para tomar um gole.
Fiquei intrigada com o facto de sempre usar a mesma caneca e pergunto sem pensar: “Porquê essa caneca em específico?” – Pergunto com um pouco de receio de ser intrusiva, mas ela responde prontamente:
- “Desde pequena que amo borboletas. Cresci no campo, por isso havia dias que as minhas brincadeiras se resumiam a correr atrás delas, para onde quer que elas fossem. Sentia-me tão livre quanto elas, numa brincadeira mútua que só nós entendíamos. Um dia adoeci e tive de passar algum tempo no hospital, a recuperar. Numa visita, a minha mãe trouxe-me esta caneca, na tentativa de me alegrar e dar forças para ficar melhor. Eu fiquei muito feliz com esse presente. Passado uns dias tive alta e sempre associei o facto de ter melhorado tão rápido à alegria que senti ao ver borboletas novamente. Desde então, com todas as mudanças que tive na minha vida onde esta caneca podia ter sido deixada para trás, sempre fiz questão que me acompanhasse, para me relembrar de onde vim e me dar a alegria certa para começar o dia”. - A partilha dela deixou-me totalmente desarmada e muito sensibilizada. Realmente os objetos deixam de ser simples objetos quando têm uma história incrível como esta por trás.
A partir daquele momento tivemos uma conversa fluída e totalmente espontânea sobre cultura, viagens, política, religião e até tecnologia. Uma hora e meia que passou em 5 minutos.
Quando me apercebo que o nosso tempo estava a acabar, peço apenas para lhe tirar uma foto que serviria para ilustrar a notícia. Automaticamente ela pega na caneca, endireita as costas e sorri. A foto perfeita que resume a essência desta conversa.
Antes de ir, acolheu-me num forte abraço e afirmou - “Obrigada por não me teres perguntado se aquele jogador de futebol é o meu novo namorado” e várias gargalhadas abençoaram o nosso momento de despedida.
As aparências muitas vezes iludem, levando-nos a tirar conclusões precipitadas e erradas sobre pessoas, situações e até mesmo objetos. Facilmente julgamos as pessoas pela sua aparência física, pela forma como se vestem, pelo país de onde vêm ou pela condição social que têm. Todas essas avaliações são altamente superficiais e quase sempre enganosas, trazendo diversos malefícios nos vários contextos onde estamos inseridos, como no âmbito profissional, nas relações pessoais ou até mesmo na saúde mental.
Neste contexto são comuns os casos em que os recursos humanos descartam candidatos altamente qualificados com base numa primeira impressão desfavorável, que pode ter sido influenciada por fatores como aparência ou timidez. Também pode acontecer que colegas e empregadores formem opiniões sobre a competência de um funcionário com base apenas em interações iniciais, o que pode influenciar as suas avaliações de desempenho e eventuais oportunidades de promoção.
Nas relações pessoais, as primeiras impressões podem influenciar a maneira como nos relacionamos com os outros. Uma impressão inicial negativa pode impedir o desenvolvimento de uma amizade ou de um relacionamento que poderia ser benéfico para a pessoa. Estas primeiras impressões são, geralmente, fortemente influenciadas por preconceitos e estereótipos sociais, levando a julgamentos injustos e à exclusão de indivíduos com base na sua raça, género, classe social ou outras características superficiais.
O julgamento com base em primeiras impressões também pode afetar a saúde mental. A preocupação com a maneira como somos notados pelos outros pode causar ansiedade social e insegurança. A pressão para causar uma boa impressão pode ser desgastante, principalmente em contextos sociais ou profissionais. O facto de ser julgado de forma negativa com base numa primeira impressão pode impactar a autoestima de uma pessoa, fazendo com que se sinto constantemente mal interpretado ou subestimado, levando a sentimentos de inadequação e desvalorização.
Embora as primeiras impressões sejam quase naturais à interação humana, é muito importante que elas não guiem os nossos comportamentos seguintes e perceber que o ser humano é muito mais do que aquilo que aparenta exteriormente. É crucial estarmos conscientes dos malefícios dos julgamentos precoces e fazer um esforço constante para olhar mais além do que pode parecer evidente.
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